Editado há uns meses em França e em setembro em Portugal, pela Ala dos Livros, "Os 'Les Portugais'" é uma evocação global da emigração portuguesa para França, feita a partir de pequenas histórias individuais.
"Os 'Les Portugais'" é uma evocação global da emigração portuguesa para França.
Escrito por F. Cleto e Pina
Foi isso que revelou ao Jornal de Notícias Olivier Afonso, o argumentista, filho de emigrantes portugueses, durante a sua passagem pelo recente Amadora BD, onde esteve patente uma conseguida exposição, com os originais e "malas de cartão" com cenas marcantes do livro. Lembra que o pai não lhe "contava histórias desse tempo, por pudor, dizia sempre que não tinham importância", mas Afonso ouvia-as desde sempre "nas conversas dele com os tios e amigos".
Crescendo "a ouvir essas histórias, essas anedotas" sentiu "que era uma pena que ficassem limitadas à transmissão oral, era necessário fazer algo que as retivesse no tempo". Ligado à indústria cinematográfica, como maquilhador de efeitos especiais, começou a escrever um guião sobre "dois homens que se conhecem em França, depois de passarem a fronteira a salto, e sobre as dificuldades que viveram". Falou com vários produtores, "que se mostraram interessados, mas era um projeto que ficava muito caro, por isso acabou numa gaveta".
Chico, o desenhador, apesar do nome com que assina, não tem qualquer ligação com Portugal. "É apenas um pseudónimo afetuoso que vem do liceu" e que adotou "porque ligava bem com este livro" e o "verdadeiro nome, Aurélien Ottenwaelter, é demasiado longo e difícil de pronunciar", disse ao JN, com uma gargalhada. A sua entrada no projeto aconteceu "anos mais tarde", evoca Afonso. "Falei da história e propus-lhe desenhá-la; ele gostou e aceitou."
A emigração deixou marcas na geração seguinte. Afonso recorda que em pequeno "sentia que não pertencia a lugar nenhum: em França, era português, quando vinha a Portugal, era francês".
Chico, que desenha storyboards para cinema, teve "desde sempre o sonho de fazer BD. As primeiras foram histórias curtas, mas este é o primeiro álbum. A história tocou-me, era o tipo de universo que queria desenhar, tudo se desenrolou facilmente, sem pressão de prazos". Confessa que "desconhecia as situações que o livro descreve, apesar de ter tido colegas portuguesas quando era pequeno, bem como as questões relacionadas com a ditadura em Portugal e a Guerra Colonial". Por isso considerou "pertinente incluir um resumo no álbum" para ajudar os leitores a situarem-se no contexto. Olivier Afonso complementa: "Foi importante uma visão exterior, para mim havia coisas adquiridas; foi necessário explicar uma série de detalhes, que dão credibilidade e fidelidade. Queria contar uma história universal, que não fosse de ninguém em particular".
Os seus pais, que viveram partes da história, "só viram o livro terminado; quis que provocasse uma reação real; ficaram muito comovidos." E complementa: "O meu pai sempre disse que as suas histórias não interessavam a ninguém e afinal interessam a muita gente, portugueses e franceses que não conheceram aquela realidade".
Do livro retém o final: "Foi o Aurélien que o propôs e achei que era excelente. Quando os meus pais leram, a minha mãe começou a chorar e disse que foi exatamente assim que tudo aconteceu. Foi muito emocionante. Conseguimos valorizar pessoas que não se sentem valorizadas."
Uma vez publicada a obra, foram muitos os emigrantes que os abordaram: "Não só portugueses; em França há uma emigração muito diversificada: espanhóis, italianos, polacos, que viveram o mesmo". Houve muitas pessoas que manifestaram a sua satisfação, a sua ternura, a sua solidariedade. Houve muita gente que disse que passou por situações semelhantes", acrescenta o argumentista, "e é bom que estes temas sejam falados, sejam discutidos, para não caírem no esquecimento; em especial nas gerações seguintes". E sente-se muito satisfeito por ele e Chico "terem conseguido que a narrativa fosse uma aventura; era assim que a ouvia em pequeno, como uma aventura incrível, por ser possível viver daquela forma, todas aquelas coisas; partir sem saber o que lhes iria acontecer".
Se "Os 'Les Portugais'" é uma história fechada, Olivier Afonso confessa o desejo de narrar "as viagens que fazia a Portugal quando era pequeno. Mas não será para já".
[Fonte: www.jn.pt]
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