segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

MOMMY, o experimentalismo visual de XAVIER DOLAN

Mommy é o sexto trabalho do diretor canadense Xavier Dolan. Contestador e ousado, Dolan desperta a reverência de alguns e o desprezo de outros, mas demonstra incontestável competência e apuro visual em seus trabalhos.

Escrito por JEAN PEIXOTO 
Meio termo. Ao que tudo indica, este é o único termo que não interessa ao diretor canadense Xavier Dolan. Com apenas 25 anos de idade, ele lançou seu sexto filme no segundo semestre de 2014.
Contestador e ousado, Dolan desperta a reverência de alguns e o desprezo de outros. Este que vos escreve, obviamente, faz parte do primeiro grupo. Não tanto pela originalidade dos temas quanto pela abordagem narrativa diferenciada e pelo primor na exploração das possibilidades técnicas em termos de enquadramentos, planos e perspectivas.
Mommy é ambientado em um Canadá fictício, onde vigora a recém aprovada Lei S-14, que permitiria à família abandonar os filhos problemáticos sob a tutela do governo. Já na apresentação de Die (Anne Dorval), mãe de Steve (Antoine-Olivier Pilon), fui automaticamente transportado ao primeiro take do longa que fora o embrião de Mommy, o aclamado J’ai tué ma mère (Eu Matei a Minha Mãe, no Brasil) de 2009.
Inicialmente é um tanto quanto desconfortável assistir ao longa que, em sua quase totalidade, foi rodado em formato quadrado vertical (1:1). Como todos os elementos no trabalho de Dolan, o desconforto visual é programático e metafórico, pois objetiva transmitir ao espectador a asfixia sensorial pela qual transita Die, em contraponto ao violento comportamento do filho, Steve. 

A trilha sonora é um dos pontos altos de Mommy. Com um setlist que transita entre Dido, passando por Counting Crows, Céline Dion, Oasis, Lana Del Rey e Simple Plan, culmina em Vivo per lei de Andrea Bocelli, interpretado por Antoine.
As variações entre planos abertos e fechados transmitem belissimamente os conflitos e turbulências enfrentados por Die e Steve. Mãe e filho desenvolvem uma relação que transcende à belicosidade do linguajar chulo das personagens, atingindo um patamar quase incestuoso.
A chegada da vizinha Kyla (Suzanne Clément), após um violento surto esquizofrênico de Steve, é o fator determinante na construção da narrativa. A partir de então, as efusões emocionais e a tensão sexual entre os três personagens passam a triangular e só dissipam-se ao final da trama.
Nas cenas protagonizadas pelo trio, Dolan novamente dá vazão aos planos abertos, valorizando as angulações panorâmicas. 

Imprevisibilidade, drama e tragédia são as três melhores palavras de que disponho para definir esse trabalho. Apesar de não alcançar a mesma complexidade de J’ai tué ma mère, Mommy traz elementos presentes em diversos momentos da obra de Dolan, como a fatalidade, tão característica do cinema francês.
Uma aura de decepção pairou sobre meus olhos quando o filme aparentemente estaria caminhando para o fim em um movimento timelapse. Uma seleção de imagens positivistas de um futuro promissor em que Steve seria aprovado na faculdade, se casaria e teria filhos se desvelava, provocando incredulidade em quem o acompanhara até então.
Eis que a ruptura fundamental ocorre e o grande conflito existencial de Die se consuma. A grande decisão é tomada e a relação aparentemente acertada entre mãe e filho novamente se rompe de forma abrupta. Como isso ocorre, é obvio que não direi — assistam — entretanto, confesso que apesar de previsível, a carga emocional da cena justifica a vitória de Dolan no Prêmio do Júri no Festival de Cannes de 2014 .
Apesar de considerar um grande filme, Mommy passa longe de ser a obra prima de Dolan. Discordo dos críticos que o acusam de valorizar excessivamente à forma em detrimento à narrativa, pois acredito no potencial das interpretações à flor da pele e da sua importância na construção do enredo.
Para quem dispensa obviedades, recomendo que assistam Mommy urgentemente sem contraindicações.

[Fonte: www.obviousmag.org]

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