'Morre lentamente quem não viaja,/quem não lê,/quem não ouve música...' foi um hit de ano novo na Espanha
O poema Muere Lentamente (Morre Lentamente), atribuído por engano a
Pablo Neruda, circula há anos na Internet sem que nada nem ninguém seja
capaz de deter a bola de neve, ao ponto de, na Espanha, muitas pessoas
terem recebido esses versos como votos online de um feliz ano-novo. "Morre lentamente quem não viaja,/ quem não lê,/ quem não ouve música,/
quem não encontra graça em si mesmo./Morre lentamente/ quem destroi seu
amor próprio,/ quem não se deixa ajudar..." Assim começa o poema que
não se chama Morre Lentamente, mas A Morte Devagar, e não é do poeta
chileno como assegurou à EFE a Fundação Pablo Neruda, mas da escritora e
poeta brasileira Martha Medeiros.
Este verso e outros mais circulam na
internet há muito tempo e "não sabemos quem os atribuiu a Neruda, mas os
nerudianos que temos consultado não os conhecem", afirma Adriana
Valenzuela, bibliotecária da Fundação. Porque não é apenas Muere
Lentamente o único o "falso Neruda" que encontram os internautas. Também
costumam atribuir ao autor do Canto Geral os poemas Queda Prohibido,
que é de Alfredo Cuervo, escritor e jornalista espanhol, e Nunca Te
Quejes, de autor ignorado pela Fundação. O diretor executivo da
Fundação, Fernando Sáez, diz que não é a primeira vez nem será a última,
que as pessoas imputem a um poeta famoso textos que ele jamais escreveu
e cuja autoria é desconhecida.
Um dos enganos do gênero aconteceu com
um famoso texto atribuído a Borges sobre as maravilhas da vida, que nem
com sua maior ironia ele teria suportado e menos ainda escrito.
O suposto poema de Borges, Instantes, segundo esclareceu a viúva do
escritor, María Kodama, é de autoria da escritora norte-americana Nadine
Stair.
Mais estrondoso ainda foi o falso apócrifo atribuído a
Gabriel García Márquez, La Marioneta, com o qual o prêmio Nobel de
Literatura colombiano se despedia de seus amigos, após saber que estava
com um câncer. "Se por um instante Deus se esqueceu de que sou um
marionete de pano e me presenteasse com um pouco mais de vida,
aproveitaria esse tempo o mais que pudesse..." diz o texto cuja
"autoria" quase matou de verdade García Márquez, como ele mesmo disse ao
desmentir que o poema fosse criação sua. "O que pode me matar é a
vergonha de que alguém acredite de verdade que fui eu que escrevi",
disse Gabo.
Muere Lentamente é uma poesia da escritora brasileira
Martha Medeiros, autora de numerosos livros e cronista do jornal Zero
Hora, de Porto Alegre, conforme informou à EFE a Fundação Neruda.
Cansada de ver as pessoas dizendo que o poema é do poeta chileno, a
própria escritora entrou em contato com a Fundação Neruda para
esclarecer a autoria do texto, pois os versos coincidem em grande parte
com seu texto A Morte Devagar, publicado em 2000, às vésperas do Dia dos
Mortos.
Em declarações à EFE, Martha reconhece que não sabe como o
poema começou a circular na internet, já que há "muitos textos" seus que
estão na rede "como se fossem de outros autores". "Infelizmente, não há
nada a fazer", acrescenta.
A poeta e romancista brasileira de 47 anos
admira profundamente o poeta chileno Pablo Neruda, de quem se declara
uma fã, mas prefere que "cada um tenha seu trabalho reconhecido". No
entanto, não perde o sono com essas coisas e assegura que tem "humor
suficiente para rir de tudo isso".
A Fundação concorda com Martha e
afirma que pouco pode ser feito para deter esta bola de neve na rede, já
que ao fazermos uma busca no Google sobre o poema Muere Lentamente
associado ao nome do poeta Pablo Neruda, vão aparecer milhares de
referências ao poema associado ao nome do poeta.
[Fonte: www.estadao.com.br]
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