Por Suzana Velasco, de Berlim
Há
dez anos, Nicolai von Schweder-Schreiner leu um livro que ninguém
queria traduzir. Parecia impossível verter “Cidade de Deus” (Companhia
das Letras), de Paulo Lins, para o alemão.
— Também não entendi
nada, mas quis fazer — conta o filho de alemães nascido em Lisboa, que
fez a tradução para a Blumenbar e com Barbara Mesquita traduziu “Desde
que o samba é samba” (Planeta), de Lins, que será lançado em setembro
pela Droemer Knaur. — Ele escreve sobre macumba, cafetões, cenas de sexo
pesadas. Também funciona em alemão, mas uma certa confusão no jeito de
escrever precisa ser arrumada.
Já
para Michael Kegler, quando a linguagem é sexualizada, ela tem que ser
adaptada, pois “fica grosseira” em alemão. O maior desafio, diz ele, é a
oralidade.
— É difícil pegar a melodia do livro. A gente fala
diferente. Tive esse receio com o Luiz Ruffato, por causa das gírias, do
contexto cultural. Gosto de glossário, mas optamos por não usar em
“Eles eram muito cavalos”. Um nordestino em São Paulo também não tem
glossário. Deixamos o espanto da pessoa que chega — diz Kegler,
alfabetizado em Congonhas do Campo, onde viveu dos 4 aos 10 anos.
Para
estimular a intimidade com a língua, a Fundação Biblioteca Nacional
lançou este ano um programa de residência para 15 tradutores. A alemã
Wanda Jakob morou sete semanas no Leme, no Rio, onde conheceu a autora
cuja obra traduzia, Ana Paula Maia. Mas, mesmo sem contato direto, os
tradutores costumam contar com a boa vontade dos brasileiros para
explicar termos e sentidos.
— O livro da Andréa del Fuego trata
de um mundo rural, é muito poético. O do Paulo Scott também é difícil.
Mas o contato com os dois foi ótimo — diz Marianne Gareis, que nem
sempre teve experiências positivas. — Quando tinha dúvidas, Saramago me
dizia que eu entenderia quando chegasse à idade dele.
Além do
contato com o autor e o próprio português, o mais importante para Maria
Hummitzsch é ler muito em alemão — que, no fim das contas, é a língua em
que eles escrevem:
— O tom para mim só sai no final. Quando
traduzo a primeira versão penso muito na língua portuguesa. Depois
preciso trabalhar como dar sentido àquela história em alemão.
[Fonte: www.oglobo.globo.com]
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