Escrito por DUARTE IVO CRUZ
Referimos hoje a celebração, na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - URFJ, de um colóquio sobre o centenário do nascimento de Sophia de Mello Breyner Andersen e de Jorge de Sena, ambos como bem sabemos escritores e dramaturgos de grande prestígio. Intitulado justamente “Sena & Sophia: Centenários”, o colóquio é uma oportuna iniciativa do Real Gabinete Português de Leitura e precisamente da Cátedra Jorge de Sena da referida Universidade: e é interessante referir esta dualidade temática, Sophia e Sena, a partir insista-se, do centenário do nascimento de ambos os escritores, sendo certo que Sena falece em 1978, e Sophia em 2004.
Já aqui evocamos o teatro de Sophia, em três artigos recentes, onde analisamos a dramaturgia desta extraordinária escritora que tanto prestigiou a criatividade poética, literária e dramatúrgica da literatura de língua portuguesa. Para esses artigos remetemos, salientando, entretanto, uma vez mais, a relevância e projeção que o colóquio representa, tendo em vista o âmbito prestigiado e prestigiante da UFRJ.
Mas veja-se agora que é interessante e prestigiante para as entidades organizadoras e também obviamente para a cultura portuguesa em geral, esta evocação da obra e da personalidade de Jorge de Sena. E então, merece o maior destaque a circunstância de que a iniciava se deve à precisamente designada Cátedra Jorge de Sena, da Faculdade de Letras da UFRJ, o que demostra a relevância do escritor.
E dado que esta rubrica se constitui precisamente num conjunto de análises a partir da arte cénica, referiremos então sobretudo a dramaturgia de Jorge de Sena, sem esquecer, note-se, a heterogeneidade e qualidade da sua obra geral, que noutra ocasião poderemos analisar.
Efetivamente, Jorge de Sena, apara além de um ato breve inicial de expressão mais realista, “Luto” (1938), inicia em 1945 uma renovação das expressões do teatro-texto, através algo paradoxalmente de reestruturação do teatro de temário histórico, com “O Indesejado - António Rei” (1945). E logo aí ressalta a modernização/inquirição dos temas e do estilo dominante do teatro: trata-se efetivamente de uma tragédia antissebastianista, digamos assim, que como tal rompe com uma tradição clássica secular no teatro português...
E mais escreveu para a cena Jorge de Sena, perdoe-se a quase redundância, através de uma série de textos dramáticos que vão buscar a temas por vezes de evocação histórica como que uma análise crítica da realidade do seu tempo: assim temos “Amparo de Mãe” (1948), “Ulisseia Adúltera” (1948), “A Morte do Papa” (1964), “O Império do Oriente” (1964), “O Banquete de Dionísios” (1969), “Prometeu ou o Homem que Pensava demais” (1971).
Mas não ficou por aqui a intervenção do Jorge de Sena no teatro. Na verdade, colaborou com António Pedro e nos relevantes - na época pela renovação e culturalmente ainda hoje - Companheiros do Pátio das Comédias e Teatro Experimental do Porto. E mais: de junho a setembro de 1948, Jorge de Sena adaptou para a rádio nada menos do que 13 romances policiais emitidos no então importante Radio Clube Português num programa produzido por António Pedro, com quem aliás colaborou no Teatro Experimental do Porto.
Tal como como escreveu Luis Francisco Rebello, parte das peças de Jorge de Sena “direta ou indiretamente se reconduzem á estética e à ética do surrealismo”. (in “O Jogo dos Homens” 1971). E tal como eu próprio escrevi, e seja-me permitida as autocitações, “Jorge de Sena representa a mais acabada continuidade e complementaridade entre o Surrealismo e o Classicismo”, no contexto de “uma visão muito ácida e crítica da sociedade portuguesa…” (in História do Teatro Português” ed. Verbo 2001 e “Teatro em Portugal” ed. CTT 2012).
[Fonte: www.e-cultura.blogs.sapo.pt]
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