Escrito por MARCO NEVES
Hoje levo os leitores deste blogue a uma viagem por cinco palavras da mais estranha língua dos nossos arredores. Sim, o basco. Há uma surpresa lá pelo meio: pois quem diria que, a partir do basco, iríamos acabar por falar de índios e cowboys?

Ao contrário do que se possa pensar, o basco é hoje uma língua em crescimento — mas sobre esse fenómeno falaremos noutro dia. Para já, queria mostrar este mapa, talvez pouco conhecido em Portugal. São as sete províncias que os nacionalistas bascos consideram parte da sua pátria.
Neste mapa, quanto mais verde estiver uma área, maior a percentagem de falantes do basco. Nas áreas mais escuras, a percentagem é superior a 80%.
As três províncias à esquerda (uma delas tem um buraco no meio, o que é curioso e talvez mereça um artigo um dia destes) constituem o País Basco que todos conhecemos, que é uma comunidade autónoma de Espanha. A província maior, ao meio, é Navarra, uma outra comunidade espanhola, separada do País Basco. As três províncias no canto superior direito são parte de França.
Se o leitor olhar com atenção, verá que há uma província (a que tem o buraco no meio, ou seja, Álava) onde o basco quase desapareceu. O peso da língua está em Guipúscoa (capital: Donostia / San Sebastián), no norte de Navarra e em França… Diz-me quem já lá foi que há aldeias de Guipúscoa onde é difícil encontrar alguém a falar espanhol na rua. Por outro lado, se formos passear para Bilbau, será difícil ouvir alguém a falar em basco, a não ser que entremos numa escola.
Aqui ficam os nomes bascos das sete províncias:
- Bizkaia
- Araba
- Gipuzkoa
- Nafarroa Garaia
- Lapurdi
- Nafarroa Beherea
- Zuberoa
Bem, chega de mapas. Vamos às palavras:
1. Itsaso (mar)
Esta bela palavra engana bem, pois estamos habituados a olhar para o mar e ver por ali a ondear uma só sílaba. Em basco, o mar tem esse som mais picado — e, se há povo marítimo, são os bascos — que chegaram longe nos seus barcos de pesca.
2. Itsasgizonak (marinheiros)
Os marinheiros bascos chamam-se «itsasgizonak» — que significa, literalmente, «homens do mar». Temos «itsaso» (mar), «gizon» (homem) e o «ak» que marca o plural.
Pensará agora o leitor: para um povo de marinheiros, será estranho que nenhum deles seja conhecido. Ora, talvez se lembre dos livros de História que o nosso Fernão de Magalhães tentou dar a volta ao mundo, só que morreu a meio. Quem terminou a viagem foi um tal de Elcano, que também pode ser chamado de Elkano — e era basco… E não foi o único marinheiro basco que andou pelo mundo!
2. Arrantzaleek (pescadores)

Os pescadores bascos aventuraram-se desde muito cedo pelas águas do Atlântico Norte e chegaram bem longe. É possível que tenham arribado às costas americanas ainda antes de Colombo.
Mesmo que não tenham sido os primeiros europeus a pisar aquelas terras, a verdade é que se tornaram presença assídua por aquelas paragens — e surgiu até uma espécie de lingua franca (o pidgin referido neste artigo) que misturava basco com línguas dos nativos americanos. Os nativos americanos usaram, durante muitas gerações, várias palavras bascas.
Estas voltas do mundo são curiosas, não são? Aqueles índios que imaginamos imponentes, em cima do cavalo, à espera dos cowboys, podiam muito bem usar entre eles algumas palavras bascas, aprendidas décadas antes da boca dum pescador na foz do rio São Lourenço. Os Pirenéus em contacto com o Velho Oeste…
Nesta página, encontramos um artigo da Smithsonian Magazine sobre a presença basca na América do Norte.
4. Ur (água)

Fonte: UK Data Explorer
Se o nome do mar parece, em basco, ter sílabas a mais, a água parece ficar reduzida ao murmúrio duma fonte. Mas isto são impressões dum português a tentar orientar-se no meio de palavras tão estranhas — na verdade, este «ur» é interessante mais por ser tão diferente de todas as águas em seu redor do que por nos soar, por acaso, a murmúrio.
5. Bost (cinco)
No quinto lugar, deixo o próprio número 5.
Se alguém ficou com curiosidade, aqui ficam os dez primeiros números em basco:
- bat
- bi
- hiru
- lau
- bost
- sei
- zazpi
- zortzi
- bederatzi
- hamar

St Jean Pied de Port, no País Basco francês. Em basco, a terra chama-se Donibane Garazi.
Podia ter optado por outras palavras mais conhecidas — por exemplo, «kale borroka» (luta de rua) ou mesmo a palavra usada para descrever alguns partidos bascos: «abertzale» (uma palavra inventada pelo pai do nacionalismo basco, Sabino Arana, e que significa «patriota»).
Há ainda o próprio nome do País Basco, «Euskal Herria», que se aplica não à comunidade autónoma espanhola (que se chama, em basco, «Euskadi»), mas sim toda a nação basca como entendida pelos nacionalistas, o que inclui as sete províncias que vimos no início.
Podia ainda referir a expressão «ongi etorri» (bem-vindo), que já vi em placas na estrada e dá sempre jeito, ou aquela expressão que tantos aprendem a dizer em muitas línguas: «maite zaitut» (amo-te).
Mas fiquemo-nos, por hoje, por mais esta palavra:
«Agur!» — ou seja, adeus!
[Fonte: www.certaspalavras.net]
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