sexta-feira, 19 de maio de 2017

"Guerra" a resumos e ler autores de língua portuguesa para melhorar domínio do idioma

O ex-ministro das Finanças e da Educação, Guilherme d’Oliveira Martins, desafiou os professores a combaterem os “resumos” de obras literárias e a porem as crianças a ler escritores de língua portuguesa para melhorar o domínio do idioma.


“Guerra aos resumos”, defendeu Guilherme d’Oliveira Martins, numa conferência na cidade do Porto, considerando que os resumos das obras literárias são “uma praga” e que terão de ser os professores a ter a “preocupação muito grande” de pôr os “alunos a ler os textos originais”.
Guilherme d’Oliveira Martins deu mesmo como exemplo a leitura de “Os Lusíadas” pelos mais jovens, evocando Vasco Graça Moura, autor da obra-prima pedagógica sobre Camões, escrita em oitava rima, mas “acessível a um jovem de 15 anos do nosso tempo”.
O antigo ministro, que coordenou o estudo recentemente entregue ao Ministério da Educação sobre o Perfil do aluno do Século XXI, que define as competências que os estudantes devem ter à saída do ensino obrigatório de 12 anos, referiu que os alunos, para terem um bom “domínio da língua”, devem ler escritores de língua portuguesa, que podem ser portugueses, angolanos, brasileiros ou moçambicanos.
Ler os grandes poetas como Cesário Verde, Fernando Pessoa, Camilo Pessanha, Teixeira de Pascoais, mas também autores brasileiros como Manuel Bandeira, João Guimarães Rosa, autores moçambicanos como José Craveirinha ou Mia Couto ou o angolano Pepetela é determinante para conhecer a língua portuguesa, para fazer da língua portuguesa “uma realidade viva” e para os lusófonos se “entenderem melhor”, defendeu o também administrador da Fundação Calouste Gulbenkian.
“Ponhamos as nossas crianças a decorar poesia portuguesa”, defendeu, reiterando que “se tem de pôr as crianças em contacto com a boa literatura que atingiu a sua maturidade poética no século XV com Camões, ou a maturidade da prosa com [Padre António] Vieira, prosador do século XVII”, disse, considerando que é preciso ter um bom domínio da língua e comunicar bem a língua portuguesa, porque, ao se comunicar bem, haverá “melhores cidadãos” com “ideias claras” para melhorar o mundo, explicou.
A língua portuguesa será falada no final do século XXI por cerca de “450 milhões de pessoas”, antecipou o ex-governante. 
“Só cinco línguas vão crescer significativamente no próximo século no mundo — mandarim, hindi, inglês, espanhol e português. O espanhol e português, as línguas ibéricas, vão desenvolver-se como línguas nativas, enquanto o inglês se vai desenvolver em parte como língua estrangeira”, explicou o antigo ministro.
“É uma grande responsabilidade de Portugal”, considerou, acrescentando: “Somos europeus, mas temos uma projecção global e universal. Somos um país médio, mas com responsabilidades de grande potência, em virtude da afirmação da língua portuguesa”.
Durante a conferência que proferiu hoje na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, no âmbito do Congresso Internacional Filosofia e Literatura: entre Portugal e Macau, o administrador da Gulbenkian referiu ainda que Camões está em Macau, por causa da língua.
Citando Camilo Pessanha, Guilherme d'Oliveira Martins recordou que o escritor tinha sugerido que se parasse de discutir sobre se Camões esteve ou não em Macau.
"Camões está em Macau. Hoje realmente o português está vivo nas circunstâncias que se sabe, e está mais vivo do que nós suponhamos em Macau em 1999", declarou o antigo ministro das Finanças e Educação. Oliveira Martins recordou ainda os tempos em que foi ministro da Educação e em que se deparou com “imensas dificuldades” para garantir professores de português em Timor-Leste.
“Não é fácil, muitas vezes temos de combater determinadas inércias, porque havia pessoas que diziam que ia deixar de haver procura do português”, recordou, acrescentando que Xanana Gusmão um dia disse-lhe que quando morrer a língua portuguesa em Timor, morre também o tétum (crioulo asiático de base portuguesa) em Timor-Leste. 
Guilherme d'Oliveira Martins participou hoje no Congresso Internacional Filosofia e Literatura: entre Portugal e Macau, que está a decorrer ao longo do dia na sala de reuniões da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde vão ser abordados temas como "Da relação original filosofia-poesia no pensamento contemporâneo português", "A comunidade que vem? A Lusofonia: da utopia à sombra do real" ou "Porque és um povo que abandona a tua casa - desamparo português".

[Fonte: www.dn.pt]

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