Escrito por Pública - Agência de jornalismo investigativo
Este artigo, escrito por Bruno Fonseca, Jessica Mota, Luiza Bodenmüller e Natalia Viana, foi publicado originalmente [1] a 6 de setembro de 2013 pela Agência Pública, na cobertura especial #SpyFiles3 [2].
Pouco depois de ser informada sobre a espionagem que sofrera da
Agência de Segurança Americana (NSA), a presidenta Dilma Rousseff pediu
aos ministros Paulo Bernardo (Comunicações) e José Eduardo Cardozo
(Justiça) para incluir no Marco Civil da Internet [3] [uma
carta dos direitos dos internautas brasileiros] um dispositivo que
permita suspender a operação de empresas que cooperarem com esquemas de
espionagem internacionais. “Pode ser banco, empresa de telefonia”, disse
o ministro das Comunicações.
Mas garantir a segurança de dados sensíveis pode passar também pelas
empresas multinacionais de vigilância, já que boa parte da crescente
demanda por vigilância na Copa do Mundo será suprida por gigantes do
setor – as mesmas empresas que provêm equipamentos e softwares para
polícias de todo o mundo, incluindo o governo americano e a NSA.
Grande parte delas é mencionada na recente publicação, pelo
WikiLeaks, do projeto Spy Files 3, um compilado de 249 documentos de 92
empresas, entre brochuras, contratos e metadados referentes a alguns dos
principais empresários do setor. Eles mostram que, com a perspectiva
dos megaeventos, o Brasil se tornou prioritário para a indústria de
vigilância global.
A Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos (SESGE)
vem adquirindo várias tecnologias para segurança pública. Já foram R$
200 milhões de reais [cerca de 87 milhões de dólares americanos]
executados em contratos de âmbito nacional. E a indústria de
equipamentos de vigilância tem apostado pesado em aproveitar essa
oportunidade. Nos últimos anos, diversas feiras empresariais têm
acontecido no país.
Quando especialistas de vigilância se juntam
Em julho, em Brasília, foi a vez da ISS World, que reúne policiais,
agentes de segurança e analistas de inteligência para treinamento em
interceptação legal, investigações eletrônicas de alta tecnologia e
recolhimento de inteligência de redes. Financiada pelas maiores do ramo,
como Gamma Group, Hackingteam, Cobhan Surveillance, Hidden Technology,
GlimmerGlass e a brasileira Suntech, são os seus diretores que dão os
workshops.
Alguns cursos ensinavam, por exemplo, a usar as redes sociais para
inteligência de fontes abertas em investigações criminais, ou como
melhor usar o Facebook: desde segurança no Facebook até retenção de
dados e a interação com forças de segurança. Outro treinamento, dado
pela empresa Group 2000 Netherlands, abordava o funcionamento da
interceptação de dados em nível nacional, combinada com LBS
(Location-based service) – um serviço de programação de computador que
permite incluir localização e horário no sistema usado. A empresa IPS
teve como tema Mídia Social e webmails: arquitetura de Big Data para
interceptação massiva, além de um curso sobre “intrusão esperta” de
redes sociais e webmails. A empresa brasileira Suntech, que hoje faz
parte do grupo americano Verint, financiou um dia todo de treinamento,
com foco especial em interceptação de telecomunicações.
Além da ISS, a LAAD, Latin American Aerospace & Defence, a
principal feira de empresas de segurança e defesa da América Latina é
realizada no Brasil desde 1995, com apoio dos Ministérios da Defesa e da
Justiça. Nos últimos anos, os megaeventos têm sido o principal foco
dessa feira, base para grandes negócios na área.
Em 2011, por exemplo, o Ministério de Defesa anunciou o projeto para o
Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON), baseado em
uma rede de sensores interligada a sistemas de comando e controle. Os
militares queriam acelerar a construção do sistema por conta da Copa do
Mundo e das Olimpíadas. O custo estimado, de R$ 6 a 7 bilhões [entre 2.7
e 3.1 bilhões de dólares americanos], animou o mercado internacional. E
com razão: apesar da construção do sistema ter sido entregue a uma
subsidiária da Embraer, o Grupo Saab, da Suécia, divulgou que sua
subsidiária alemã MEDAV vai fornecer, como subcontratada, estações de
sensores estacionárias e móveis para o programa, com capacidade de
monitorar e identificar a direção nas frequências HF, VHF e UHF.
Este ano mais de 30 mil visitantes compareceram à LAAD, que abrigou
720 expositores de 65 países, entre eles os representantes dos
ministérios de Defesa da Ucrânia, Reino Unido, Argentina e África do
Sul. Em 2014, ano da Copa do Mundo, uma versão menor, apenas sobre
segurança, está marcada para os dias 8 e 10 de abril de 2014 no
Riocentro.
[Leia a segunda parte da reportagem: IBM no Brasil, vigilância nas ruas: comando e controle [4]]
Artigo publicado em Global Voices em Português: http://pt.globalvoicesonline.org
URL do artigo: http://pt.globalvoicesonline.org/2013/09/23/com-a-copa-brasil-vira-mercado-prioritario-da-vigilancia/
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[1] Image: http://www.apublica.org/2013/09/copa-brasil-vira-mercado-prioritario-da-vigilancia/
[2] #SpyFiles3: http://www.apublica.org/assunto/spyfiles3/
[3] Marco Civil da Internet: http://pt.globalvoicesonline.org/2012/08/06/brasil-marcocivil-opinioes/
[4] IBM no Brasil, vigilância nas ruas: comando e controle: http://pt.globalvoicesonline.org/2013/09/24/ibm-no-brasil-vigilancia-nas-ruas-comando-e-controle/
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