Estreia amanhã a 2ª edição do programa do canal História, Portugal Desconhecido. Uma das protagonistas desta edição será Daniela Ruah. Ao Diário de Notícias, Ruah falou sobre as suas influências judaicas e desvendou alguns detalhes deste especial de 120 minutos, composto por 24 histórias que prometem surpreender
Escrito por Alexandra Pedro
Nasceu nos Estados Unidos da América e viveu lá até aos seus seis anos. Com dupla nacionalidade, Daniela Ruah foi criada numa das famílias mais influentes da comunidade judaica nacional.
Este sábado, a atriz de Investigação Criminal: Los Angeles, juntamente com figuras como Isabel Stilwell, Luís Filipe Borges e Ricardo Carriço, será uma das protagonistas da segunda edição do programa Portugal Desconhecido, no canal História.
As histórias da comunidade judaica de Belmonte, a forma como as embarcações dos navegadores portugueses percorreram o mundo e ainda a influência da astrologia na vida de Fernando Pessoa, são alguns dos temas que vão ser retratados neste especial de 120 minutos, a estrear este sábado, pelas 21h30.
Em entrevista ao Diário de Notícias, Ruah assumiu que foi bom «conhecer mais» sobre uma linhagem que não é a sua e confessou algumas das influências judaicas que permanecem na sua vida. «Sinto que me adapto com muita facilidade a outras culturas, lugares e pessoas, por exemplo. Não sei se tem a ver com a minha herança judaica mas, pelo menos para mim, essa é uma das coisas que trago comigo», diz.
Sobre o período negro que a comunidade judaica viveu, nomeadamente o Holocausto, a atriz de 34 anos diz que ainda hoje lhe é difícil envolver e falar sobre o tema. Pela proximidade, pela história da sua família e porque, tal como sublinha, «no fundo, ainda hoje há "Holocaustos" a acontecer. «Na Síria, por exemplo, acaba por estar a acontecer um Holocausto, aquelas pessoas estão a ser assassinadas», frisa.
Leia aqui a entrevista completa com a atriz:
Falando já sobre o episódio do canal História. O que mais a surpreendeu?
Descobrir mais sobre os judeus de Belmonte. Tinha pouca informação sobre o assunto e apercebi-me que as pessoas à minha volta sabiam bastante. Incluindo, por exemplo, o meu pai e amigos de família. Apesar de a minha linhagem não passar em Belmonte, foi importante conhecer a linhagem sefardita.
Haverá uma descoberta do público em relação a esta cultura?
Claro, toda a gente sabe que tivemos Inquisição em Espanha e em Portugal e que houve uma perseguição aos judeus. Mas acho que não há assim tantas pessoas que conhecem a história de Belmonte. Quem assistir ao programa vai ficar surpreso, porque existe realmente um povo que vivia em segredo, fingindo que eram cristãos quando não eram.
O que sentes em relação a esta parte mais negra da História?
Nós
temos uma História de perseguição muito longa. Antes da Inquisição, nos
tempos bíblicos, passando para o período do Holocausto e até aos dias
de hoje. Existem vários sítios em que se sente algum antissemitismo.
Estes episódios
fizeram-me pensar na parte da perseguição, em como somos um povo que
teve de mudar geograficamente de sítio e adaptar-se às diferentes
culturas diferentes e mesmo assim acabavam por se enraizar.
De que forma é que crescer no seio de uma família judaica te influenciou?
A
religião judaica passa pela parte religiosa, pela parte cultural e
forma de estar. Temos, por exemplo, costumes gastronómicos um pouco
diferentes. Não como porco, por exemplo, e há pessoas que não misturam
certas comidas, como leite com carne da vaca. Há também quem não coma
marisco. Em relação à religião, posso dizer que tenho os meus
costumes.
E depois estas mudanças de sítios que tivemos de ter. Não
sei se influenciou, mas sinto que me adapto com muita facilidade a
outras culturas, lugares e pessoas. Não sei se tem a ver com a minha
herança judaica mas, pelo menos para mim, essa é uma das coisas que
trago comigo.
Tentas passar também essa herança aos teus filhos?
Claro.
O meu filho, se lhe perguntarem, diz que é "meio luterano, meio judeu".
Como o pai é luterano seguimos as tradições das duas religiões.
Nunca sentiste qualquer tipo de descriminação?
Felizmente,
nunca passei por isso. Mas continua a acontecer. O cemitério judaico
aqui em Portugal, por exemplo, já foi vandalizado. Mas creio que
antissemitismo em Portugal não é muito forte.
Consideras que afirmares a tua religião é um dado relevante para as outras pessoas? Não.
Acho que se as pessoas acabam simplesmente por descobrir. Não é algo
que eu diga numa introdução de conversa. Mais depressa digo que sou
portuguesa. Os meus amigos até gozam comigo: «Dentro de cinco minutos a
Daniela diz que é portuguesa».
E as reações são positivas?
As
pessoas acham interessante. Em Nova Iorque temos uma comunidade muito
grande de portugueses, mas quanto mais para oeste andamos nos Estados
Unidos, menos existem. As pessoas ficam sempre com interesse em
visitar.
A Daniela falou também do Holocausto. Já visitaste alguns locais?
Infelizmente ainda não, é algo que tenho de ganhar coragem para fazer.
Do
lado paterno da minha mãe foram todos assassinados durante o
Holocausto, o único que sobreviveu foi o meu avô - que por acaso, com
sorte, nasceu na Polónia, mas veio para Portugal em bebé. A
prima dele, que vive em Israel é sobrevivente. Ela sim passou os
horrores do Holocausto, era adolescente, na altura. Tem memórias ainda
bastante vivas mas é uma coisa sobre a qual não fala. Ainda
me impressiona muito. O próprio filme da Lista de Schindler, do
Spielberg, demorei muitos anos para ver. Custa-me.
Pela proximidade?
Sim. Até pelo meu aspeto moreno e estas feições. Eles iam muito pelo físico das pessoas, portanto, tendo nascido de pai e mãe judeus, naturalmente, também teria sido vítima. Custa-me muito envolver. Mas nos Estados Unidos faço doações mensais ao museu do Holocausto. Acho importante manter tudo o que é memórias sobre o assunto.
É um assunto que tratas com cuidado?
Emocionalmente sou muito sensível a este assunto, não só pela minha cultura, mas também por outras. No fundo, há Holocaustos que estão neste momento a acontecer. A Síria, por exemplo, acaba por ser um Holocausto, aquelas pessoas estão a ser assassinadas.
Essas memórias mais duras vais querer contá-las também aos teus filhos?
Com certeza. Vou esperar que tenham alguma maturidade para perceber o assunto. Acho que nesta altura ainda é muito cedo: ou lhes vai passar ao lado ou vou acabar por chocá-los demasiado e traumatizá-los.
[Fonte: www.dn.pt]
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