quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Lusofonia: a língua é apenas um ponto de partida

Joaquim Chissano e José Ramos-Horta sentem falta de uma TV internacional em português. O brasileiro Celso Lafer quer uma CPLP "dos cidadãos".
Quatro homens nascidos abaixo do Equador, como lembrou o moderador Nicolau Santos, formaram
o painel que debateu o papel da língua portuguesa no mundo.
Pedro Cordeiro
Fará sentido pensar em "lusofonia"? Foi com este desafio que se iniciou a tarde da conferência do Expresso. O painel - composto pelos ex-Presidentes de Moçambique e Timor-Leste, Joaquim Chissano e Ramos-Horta, e Celso Lafer, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do Brasil - pediu projetos concretos para a lusofonia. Entre eles, uma espécie de cadeia Al-Jazeera, mas em português.
Para os oradores, a língua é "um ponto de partida". Ramos-Horta acha que "é preciso popularizar a Comunidade de Países de Língua Portuguesa". "Seria bom os media tornarem a realidade da CPLP interessante para os jovens", sugeriu. Critica, como Chissano, os canais internacionais da RTP. "A língua podia ser mais popular se houvesse uma televisão portuguesa mais criativa. Na RTP Internacional que chega a Timor só a minha mãe, que tem quase 90 anos, é que está interessada. Vemos constantemente um tal senhor Baião". Uma criança timorense chegou a achar que o apresentador da RTP era o presidente português, contou Ramos-Horta. "A TV Globo, lá em casa, ganha à RTP África por ter programas educativos", acrescentou Chissano.
O ex-presidente moçambicano vê na lusofonia um espaço de "comunhão de culturas", mas considera que isso é mais verdade no Brasil e nos PALOP do que em Portugal. Confrontado pelo moderador, Nicolau Santos, com a popularidade de artistas como o pintor Malangatana em Portugal, afirmou que, ainda assim, a cultura dos outros países lusófonos é vista como "exótica" por cá, não estado "embrenhada".
Chissano apela a uma "reflexão profunda" sobre os interesses comuns dos que falam português. Acha "redutor" ver a lusofonia apenas como conjunto de países em que se fala português. "Em certos distritos de Moçambique tenho de usar intérprete", explicou. Promover o português, uma língua "de modernidade", "facilita intercâmbios" sem sufocar os idiomas minoritários, diz.
Para Lafer, a língua é "um ingrediente da projeção internacional do Brasil". Defende que aquele país e Portugal são "centros irradiadores" da lusofonia, mas Chissano avisa que isso pode mudar: "África é a zona onde a população mais cresce". Lafer pensa que a CPLP pode ajudar os PALOP a encontrar "meios e modos para enfrentar desafios". Dentro de cada país, a língua reforça a identidade, acrescentou o académico. No plano externo, facilita os processos diplomáticos.
Demasiadas reuniões
A lusofonia só fará sentido se for "apropriada pelos cidadãos", diz Lafer. "Não queremos uma CPLP dos Estados", sentenciou. Ramos-Horta partilha a preocupação, reprovando a multiplicação de reuniões ministeriais na CPLP. "Parece copiar as organizações regionais, coisa que não é. Não vejo utilidade em reunir os ministros do Turismo da CPLP."
O peso do português tem crescido em Timor: 23% dos timorenses falam a língua, banida durante os 25 anos de ocupação indonésia. O Conselho de Ministros e o Parlamento usam o português e, graças à tecnologia, "é possível ler jornais portugueses em qualquer aldeia de Timor", disse Ramos-Horta, fiel da edição do Expresso para iPad. Grato pelo "esforço enorme" de Portugal e Brasil, elogiou os "muitos professores" que enviaram para Timor, para ensinar discentes e docentes timorenses. 
[Foto: Alberto Frias - fonte: www.expresso.sapo.pt]

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