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Urna eletrônica utilizada em votações no Brasil
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Escrito por Sérgio Rodrigues
Votos de bons
votos para todos os brasileiros em 2018.
A frase acima
expressa dois desejos. Um é evidente: o de que as eleições de outubro reponham
nos trilhos um país descarrilado, embora esse futuro pareça improvável visto
daqui. O outro, nem tanto.
O segundo desejo
adentra o temerário (para qualquer cronista) terreno da metalinguagem: chamar a
atenção para duas das acepções que a palavra "voto", vinda do latim
"votum", carrega por aí.
A aposta é que,
mais do que curiosidade etimológica, o que liga os votos ao voto tenha valor
cívico. Estamos precisando disso.
Os votos de
feliz ano novo que abundam esta semana estão mais próximos do sentido original
da palavra do que os que se contam nas urnas.
Expressando um
desejo, fazem ligação direta com um termo latino que, sendo derivado do verbo
"vovere" (prometer), falava do empenho para a obtenção de uma graça.
O voto era, na
origem, a moeda principal no comércio entre terra e céu. Quem fazia um voto
suplicava a Deus ou aos deuses, desejava ardentemente algo, e para reforçar seu
desejo prometia, fazia uma oferenda em troca do benefício.
"Devoção"
é um termo da mesma família. O ex-voto (que significa "em decorrência de
voto") típico do catolicismo tradicional, mas que ainda pode ser
encontrado em muitas igrejas, é um objeto que representa de forma literal a
graça pretendida ou alcançada –muitas vezes um pedaço do corpo para o qual se
pede ou se agradece a cura de uma enfermidade.
O voto como
empenho e promessa feita à divindade está vivo na língua em expressões como
"voto de castidade", "voto de pobreza" e "votos
matrimoniais". As velas votivas o adjetivam.
No entanto, faz
meio milênio que esse substantivo carregado de religiosidade, espalhado por
diversas línguas modernas pelo latim eclesiástico, foi passear fora da igreja e
se plantou no vocabulário político de modo triunfante.
Consta que a
expansão de sentido que tornou o voto sinônimo de sufrágio –ato já mundano e
sem fumaça de intercâmbio com a esfera celeste– surgiu primeiro na língua
inglesa e de lá se disseminou. O francês só viria a adotar tal acepção no
início do século 18. O português, em data incerta.
Do voto em seu
sentido político, base do processo democrático, surgiram frutos vocabulares
como "votação" e "votante", praticamente equivalentes a
"eleição" e "eleitor".
É curioso notar
que estes vocábulos surgiram bem antes, apresentando já no latim clássico, como
"electionis" e "electoris", sentidos próximos dos que
carregam hoje.
No caso do
substantivo "eleição", que significa simplesmente escolha, o mais
surpreendente é seu parentesco etimológico com a palavra "elegância".
Tendo as
eleições se tornado –não só no Brasil, mas aqui também, e como!– espetáculos do
pior tipo de baixaria, parece piada. Não é: "elegantis" era o que
tinha bom gosto para escolher.
Sendo assim,
faço votos de bons votos e eleições elegantes para todos nós em 2018. A hora de
sonhar é esta.
*
[Foto: Diego Herculano - fonte: www.folha.com.br]
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