terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Com ciclovias, cada vez mais pessoas trocam carro e transporte público pela bicicleta em São Paulo

O engenheiro de software Leandro Melo, que trocou o carro pela bike em julho desse ano. Foto: arquivo pessoal

Por ENZO BERTOLINI 

Quem mora em São Paulo e gosta de bicicleta teve um 2014 diferente. A prefeitura deu início à implantação de 400 kms de infraestrutura cicloviária, sendo a primeira metade prometida para o fim de 2014.
As vantagens do investimento na infraestrutura são muitas, como o potencial de diminuir congestionamentos, diminuição da lotação dos transportes coletivos, redução na poluição atmosférica e sonora, melhoria na saúde, entre outras.
É óbvio que essas mudanças terão um impacto mais significativo na cidade, conforme o aumento da malha cicloviária e, principalmente, maior uso pela população. Quem já pedalava está aproveitando ao máximo os investimentos em ciclovias, mas, além deste grupo, há aqueles que não pedalavam por medo e hoje usam a bicicleta como principal meio de deslocamento entre a casa e o trabalho.

Ciclovia na porta de casa

O engenheiro de software Leandro Melo passou a utilizar a bicicleta para ir ao trabalho em julho deste ano. “Eu revezava entre metrô e carro. Entre caminhada até a estação, espera por mais de um trem e caminhada até o trabalho levava 40 minutos da Vila Mariana (zona sul) até o centro. Já de carro eu levava uns 30 minutos usando o aplicativo Waze. Sem ele era 1 hora.”
A opção pela bike aconteceu após uma viagem a Londres (Inglaterra), onde comprou uma bicicleta dobrável. “Eu já vinha pensando nisso há um tempo. O metrô estava sempre lotado e com carro havia o trânsito. Tentei usar a bike aos sábados, antes das ciclovias, mas abortei, porque o trânsito era muito violento.”
A sorte bateu na porta de Melo quase que literalmente, pois algumas semanas após comprar a bicicleta começaram a fazer ciclovias da sua casa até o seu trabalho. “Agora levo 25 minutos para ir e 40 minutos para voltar, por causa das subidas da rua Vergueiro.”
A experiência de pedalar até o trabalho despertou um novo olhar de Melo, que é de Recife (PE), sobre a cidade de São Paulo. “Eu tô apaixonado por São Paulo com a ciclovia, você olha a cidade com outra perspectiva, descobre coisas que não conhecia e tem tempo de observar. De carro você está sempre apressado e não vê nada.”
Melo faz parte de um grupo que vai crescendo aos poucos: os que abandonam o carro em troca de outro meio de transporte. Uma pesquisa do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) mostra que 6% dos motoristas de São Paulo abandonaram o carro por outro meio de transporte nos últimos dois anos.
A maioria migrou para os ônibus (67%) e metrô (65%). Cerca de 5% migraram para a bicicleta, um número que tende a aumentar, conforme a malha se expande. A pesquisa aponta ainda que, para 45% dos entrevistados, o trânsito é a principal razão de estresse em São Paulo.

Menos stress, mais pontualidade

Criança na ciclovia da rua Artur de Azevedo, no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo. 
O analista de sistemas Claudio Dias usava metrô ou ônibus para se deslocar da Saúde, na zona sul, para a região do Largo São Bento, no centro de São Paulo. De metrô, o tempo médio de deslocamento era de 30 minutos de porta a porta. “Eu sempre pegava no horário cheio, a ponto de você não conseguir abrir um livro e ler. Na volta, muitas vezes eu ficava até mais tarde para pegar um metrô mais humano”, lembra. A implantação de ciclovias lhe deu a oportunidade de se deslocar com segurança e tranquilidade.
Uma das principais motivações para a opção pela bike é saber que não importa o dia, Dias levará sempre 25 a 30 minutos de bicicleta. “De bike eu chego no horário certo, você não pega trânsito.” Além disso, o analista de sistemas destaca o fato de viver mais a cidade. “No metrô é tudo enlatado e de bike você chega mais relaxado e curte o caminho. Quis sair do tumulto.”
No começo, Dias chegava suado e aproveitava a infraestrutura de vestiário e estacionamento de bicicleta que a empresa onde trabalha oferece. “Hoje já aprendi a dosar meu ritmo e não chego mais suado.”
Para Dias, mais pessoas vão aderir à bicicleta com o aumento da infraestrutura. Ele diz que alguns colegas moram na zona leste, próximo ao centro, e não têm estrutura para ir ao trabalho de bicicleta. “É difícil convencer quem não tem experiência de andar na rua que é viável pedalar sem ciclovias. Temos que superar a barreira de que as ruas são para andar de carro”, completa.

A ciclovia inacessível

Ciclovias de São Paulo têm sido bastante utilizadas também por bike entregadores.
Com apenas seis quilômetros separando sua casa, na Chácara Santo Antônio, de Pinheiros, ambos os bairros na zona oeste, o engenheiro Patrick Estrabom quer tentar usar a bicicleta como modal de transporte. Ele conta com ciclovia praticamente de ponta a ponta, mas por um detalhe ainda não usa a bike: próximo à sua residência não há acesso à Ciclovia Rio Pinheiros. “A estrutura está toda pronta. Se eu já tivesse esse acesso na estação Granja Julieta eu poderia ir de bike, mas hoje vou de carro sozinho.”
“Minha vida inteira eu só andei de carro, sou o típico paulistano. Fiquei empolgado com a ideia de pedalar em São Paulo e gostaria de tentar. Hoje gasto 25 minutos para ir e entre 40 e 50 minutos para retornar. Poderia fazer exercício nesse período”, afirma.
A Ciclovia Rio Pinheiros possui 21,5 km e vai do Parque Villa-Lobos, em Pinheiros, até a avenida Miguel Yunes, na região de Interlagos. Em toda a extensão há apenas oito acessos. No site da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) a página da ciclovia está incompleta e conta seis. “Eu não quero andar pela Marginal na calçada. Tentei mandar e-mail pra CPTM, mas o site apresentou problemas e não consegui retorno”, diz Estrabom. O engenheiro também diz que não conseguiu informações sobre os acessos com facilidade na internet, pois elas estão escondidas. “Recorri a um amigo para descobrir.”
Havia a previsão de construção de um acesso em uma dessas estações da CPTM, por meio de rampa. A previsão era de que a obra estaria pronta em 2013, mas o assunto caiu no esquecimento e a CPTM parou de anunciar essa pretensão, aparentemente abandonando a ideia.
Com os outros 200 km de ciclovias prometidos para 2015, a tendência é que mais e mais pessoas tenham na bicicleta uma grande parceira de deslocamentos.

[Fotos: Rachel Schein, salvo a indicada - fonte: www.vadebike.org]

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