Por DIOGO BERCITO
em MADRI
Marc Leiba, 31, colocou na balança
durante o ano passado dois de seus traços de identidade: ser
"francês" e ser "judeu". Quando sentiu que a religião tinha
mais peso, decidiu sair da França e imigrou a Israel, onde vive.
"Eu vi
que ser judeu, que é uma coisa pessoal, me definia mais do que ser
francês", diz à Folha. "Saí da França porque acho que os judeus não
têm futuro ali."
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Durante manifestação contra operações em Gaza pessoas seguram cartaz em que se lê "Boicote Israel". |
A conclusão não é só dele.
Leiba é um dos milhares de judeus que, diante do antissemitismo em ascensão,
têm deixado o continente europeu e migrado para Israel.
O caso francês é
agudo. No primeiro semestre de 2013, 811 judeus franceses fizeram a
"aliyah" -imigração a Israel. No mesmo período deste ano, foram
2.831.
O conflito entre
Israel e militantes da facção palestina Hamas motivou, na França, diversas
manifestações contrárias ao governo israelense, respingando também na população
judaica.
De acordo com
Yonathan Arfi, vice-presidente da federação de judeus na França, oito sinagogas
foram atacadas em Paris em julho, mês do início da operação militar Margem
Protetora, em Gaza. "Pela primeira vez, tivemos gangues atacando
sinagogas. Até então, esses crimes eram cometidos por indivíduos."
CRESCENTE
A tendência, diz Arfi, ganhou força nos anos 2000, quando já se pensava que o
antissemitismo estava em rápido declínio na Europa, décadas depois do
Holocausto.
O início da
Segunda Intifada, revolta violenta de palestinos contra Israel, motivou ataques
a sinagogas e judeus no continente. Em 2006, um garoto foi sequestrado e morto
por ser judeu. Em 2012, um atirador matou quatro em uma escola judaica.
Arfi nota que, se
no passado o antissemitismo era uma causa da direita europeia, o preconceito
foi adotado também pela periferia. "As populações pobres consideram os
judeus o rosto do sistema."
A francesa Leah
Stora, 24, que também imigrou a Israel, diz nunca ter sido alvo de
antissemitismo. Ela se mudou por discordar da "atitude
individualista" na França. "Eu nunca tive medo de andar nas ruas de
Paris. Se você não é religioso, as pessoas nem sabem que você é judeu."
Mas Stora conta, também, que ouvia frases como "vocês, judeus, mataram
Jesus".
A comunidade
judaica na França é numerosa -cerca de 600 mil-, e os que fazem a
"aliyah" ainda são uma pequena parcela.
COLETIVO
A Espanha, de onde judeus foram expulsos em 1492 por decreto real, tem
atualmente uma pequena população judaica. Procurado pela Folha, o Ministério do
Interior relatou apenas três incidentes antissemitas em 2013, incluídos pela
primeira vez nesse ano como "crimes de ódio".
Mas, de acordo
com a federação judaica espanhola FCJE, "os preconceitos antigos seguem
existindo e aumentando nos últimos anos, tomando novas formas".
"Não temos
um grande volume de ataques a pessoas ou propriedades", diz a diretora
Carolina Aisen, "mas há aumento do antissemitismo no âmbito educativo,
especialmente universidades, e nos meios de comunicação."
"Há um
antissemitismo no inconsciente coletivo. É um profundo desprezo pelo judeu que
se demonstra em expressões como "judiar" e em festas populares que
tratam da difamação de judeus."
Na Escócia,
Jonathan Litewski, 26, arrecada dinheiro para financiar sua imigração a Israel.
"Não aguento mais morar em Edimburgo."
Litewski também
reúne fundos para ir à Justiça contra sua recente demissão de uma loja de
móveis. Ele diz ter sido dispensado por usar uma estrela de Davi no pescoço e
ter contado à chefe seu plano de se juntar ao Exército israelense.
[Foto: Kenzo
Tribouillard]
Contra antissemitismo, governos mudam até nomes de cidades
Preocupados com o avanço do antissemitismo
e pressionados por organizações judaicas, governos europeus têm combatido a
discriminação contra judeus também no mapa do continente.
A Espanha
votou, em maio deste ano, para mudar o nome do pequeno vilarejo de Castrillo
Matajudíos ("campo mata-judeus") para Castrillo Mota de Judíos
("campo monte de judeus").
A alteração foi um projeto do
prefeito Lorenzo Rodríguez e devolveu à vila um nome semelhante ao seu
original, Castrillo Motajudíos, que remonta ao século 11.
"Mata-judeus" foi cunhado no século 17.
A França
passa por processo semelhante. Uma organização judaica pressiona o governo para
que troque o nome da vila de "La Mort aux Juifs", traduzido como
"morte aos judeus".
De acordo
com a agência de notícias AFP, houve uma tentativa de mudar o nome de La Mort aux Juifs em 1992, sem sucesso.
A comunidade
local discorda que o termo, com origem no século 11, signifique que seus
moradores sejam, realmente, antissemitas.
[Fonte:
www.folha.com.br]
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