Escrito por Pedro Correia
Grupos de jovens ocuparam escolas secundárias e universidades, tendo sido anunciados na imprensa como "activistas" ecológicos (aquilo a que antes se chamava "militantes"). Os mais soturnos adversários de tais acções contestam(os) os ares e dizeres dos intervenientes. E nisso não deixam(os) de ter alguma razão pois alguns deles surgem em modos que julgam e querem muito significantes. Mas como nos aportam de São Domingos de Rana ou Telheiras não têm o kitsch do David Cassidy na "Família Partridge" nem o glamour ainda mais andrógino do Tim Curry ou o Bowie ou os enleios encantatórios das ariscas divas austrais desses outros tempos... Entenda-se, nem é o histriónico impúbere que incomoda, é mesmo a pungente piroseira de que se ufanam - da qual, daqui a uns anos quando virem as fotografias "de(sta) época", algo se envergonharão, meio atrapalhados. E, entretanto, alguns deles - os mais capazes - terão aprendido algo de fundamental: a forma é conteúdo.
Já quanto aos dizeres que vão exarando sobre as tais questões climáticas também não surgem muito sedimentados. Ainda que neste vector deverão (deveremos) os seus críticos ser menos radicais. Pois se em alguns há uma relativa aparente heterodoxia visual - ainda que, de facto, já muito estafada -, já nos discursos verbais a sua vacuidade, ainda que exaltada, não varia dos quotidianos dislates que se vão ouvindo dos habituais convidados da Júlia Pinheira, do Jorge Gabriel e de outros "generalistas", bem como - até - de alguns painelistas do "cabo", e já nem falo dos da galeria de locutores na imprensa e redes sociais, diariamente vasculhada pela letal humorista Joana Marques. E nisto têm os nossos "activistas" a legítima desculpa de serem putos, e nisso um superior direito à parvoíce.
Entretanto esta vaga de ocupações acabou mas os agrupamentos deixaram a promessa que voltariam à carga lá para a primavera. Algumas notas sobre isto:
1) Como se vê pelo patético conteúdo deste panfleto distribuído por um grupo de "activistas" universitários este movimento não é "ecológico". De facto, a importante questão das "alterações climáticas" é apropriada para alimentar uma agenda contestatária abrangente, a que alguns querem chamar "ideológica" mas que não o é, senda apenas uma atrapalhada e atrevida mescla de itens de "agit-prop" da agenda esquerdalha (agora dita "woke" à falta de termo português para tal mosto), sob a evidente "mão visível" do BE. Isso poderia nada mais ser do que um pouco irritante, ou mesmo só risível, se a questão climática não fosse verdadeiramente relevante. E em assim sendo esta cacofonia, este "radicalismo pequeno-burguês de fachada ecológica" - como diria Álvaro Cunhal - aliena as necessárias reflexões e verdadeiras acções face ao processo climático. Digo-o diante das patéticas acções de pirataria artística, agora encetadas (1, 2), como deste "confusionismo": apenas obstam às coalisões sociais nos esforços ecológicos. E se os putos não o percebem com toda a certeza que os seus mais-velhos o compreendem.
2) No meio da trapalhada que vêm clamando os "activistas" exigiram a demissão de Costa Silva, ministro da Economia e Mar. Acontece que nisso têm toda a razão! Costa Silva pode ser muito competente, sério e até votado ao bem público. Mas é de política que se trata, não dele como pessoa. O problema não é ter ele um percurso profissional ligado à indústria petrolífera - em última análise percebe de produção energética, será um saber fundamental para eventuais alterações. Mas, já como ministro, Silva continua a explicitar o seu apreço pelo desenvolvimento da exploração dos combustíveis fósseis. E em 2022 é mais do que tempo de enviar um tonitruante sinal político contra isto - dizer não. Dizer até chega! (passe a expressão, hoje muito poluída). E é muito criticável - e até inconsciente - que um homem com esta mundividência esteja à frente do ministério da Economia. E do Mar, imagine-se! Ou seja, talvez estas nossas pós-crianças digam muitas asneiras. E algumas delas, para incómodo de adultos eleitores, surgem muito andróginas - mas não há maior androginia do que um actual ministro da Economia e do Mar andar a salivar por explorações de gás natural. Demita-se o homem. Já! (como se dizia no PREC, como os miúdos recuperam agora...).
3) Com estas acções houve várias reacções adversas, habituais, nas redes sociais - e algumas na imprensa. Por um lado, há os radicais que negam a simples hipótese de aquecimento global, dita, até 2021 (pois entretanto o termo passou de moda) "marxismo cultural". Não me parece necessário voltar a discutir esse integrismo, de facto um mero grunhismo - muito presente nas habituais franjas de intervenção anónima na internet -, até porque o debate com integristas é inútil, a fé, especialmente esta tresloucada, não é matéria aberta à troca de argumentos.
Mas há outra corrente crítica que surge com maior "estatuto". Não só os argumentos surgem assinados - o que é um valor em si - como muitas vezes são apresentados ou ecoados por gente de prestígio: professores, técnicos de renome, autores basto publicados, "intelectuais públicos", etc. O mote crítico é-lhes comum: critica-se a esta rapaziada meio esparvoada a urgência que clamam na transição energética, o tal "já" de facto irrealizável. E nisto se vai propagando a ideia da desnecessidade da redução de agressão ecológica, o cariz meramente utópico destas preocupações. E também vão estes locutores - grosso modo, oriundos de um conservadorismo mais ou menos liberal, de um "centro" ou "centro-direita" - reduzindo esta preocupação ecológica a uma esquerda, marxista ou marxizante, acoitada na agenda ecológica para combater a economia de mercado. Em suma, apupam não só o clamor pela urgência de medidas como a própria "agenda ecológica" - e basta ver como enxovalham António Guterres, quase como os benfiquistas sempre trataram Cristiano Ronaldo...
Ora, neste caso, a resposta é muito simples: bastará esfregar nas ilustres e sonoras fauces destes doutores um breve historial desta "agenda climática": há 30 anos, na Conferência do Rio, o então presidente Bush (pai) curto-circuitou os passos iniciais de redução de gases clamando "the American way of life is not up for negotiations. Period.". Há 21 anos, logo após a sua eleição, o presidente Bush (filho), - a ligação é para o discurso dele, aposto no arquivo da Casa Branca, não para qualquer órgão do "marxismo cultural" - mesmo tendo reconhecido o processo de aquecimento global, recusou os pressupostos do protocolo de Kyoto devido a questões geoestratégicas, o que conduziu à ineficiência deste - e ao posterior abandono de alguns dos signatários. Depois chegou-se ao Acordo de Paris, manifestamente insuficiente e ineficaz.
Enfim, pode haver muita argumentação sobre este processo de política ecológica internacional. Mas há algo que é impossível negar. É que há, pelo menos, três décadas que se discute entre as maiores potências mundiais, e em vários cenários multilaterais, um necessário "Que fazer?" diante da incomensurável depredação ecológica. Sem que se activem conclusões que desde há muito são urgentes. Agora estes nossos apatetados petizes aparecem a disparatar aos gritos "Já!". E os nossos doutores e engenheiros, professores, técnicos, assessores da função pública, "anunciados na tv" e colunistas da imprensa de referência, surgem enfastiados e sobranceiros, dizendo-os patetas (que o são) pois apressados... São estes tipos avalizados dotados de sageza "conservadora"? Não, são meros cagões.
Ou seja, antes um charro com estes putos insuportáveis do que um uísque japonês com estes doutores.
[Fonte: delitodeopiniao.blogs.sapo.pt]
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