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Escrito por Sérgio Rodrigues
O texto fofo pode estar impresso na caixa de leite,
tentando nos convencer de que o líquido ali contido jorrou das tetas de duas
vacas simpaticíssimas, Mimosa e Malhada, que o seu Zé da Nena ordenha com amor
toda manhã em seu sítio de Bichinho.
Crédulo e confiante na credulidade do leitor, o texto fofo ignora a
incongruência entre a cena pastoril e seu suporte industrial, adornado com selo
do Ministério da Agricultura e letras miúdas falando em estabilizantes hostis à
pureza láctea de Mimosa e Malhada, como o trifosfato de sódio.
Também se encontra o texto fofo em embalagens de suco industrializado, a
nos garantir que sorveremos o sumo de frutas colhidas por seu Pádua e dona
Carlota em seu pomar de Itapecerica da Serra, depois da curva do rio, ali onde
cantam mais alto os sabiás.
Esses exemplos podem sugerir que o texto fofo só brota no mercado de
alimentos, mas isso não é verdade. O que comemos e bebemos tem sido embalado em
imensa fofura textual, mas nada impede um xampu, por exemplo, de se expressar
assim (e agora não faço uma caricatura, mas copio palavra por palavra):
"Relaxa, darling! Com nosso tratamento que não cresce pelo, mas cabelo
(hehe), sua linda cabeleira será o antes e depois."
Sim, alguns textos fofos são tão mal escritos que jogam no ralo a planejada
fofice, mas isso não é uma regra. Sua única obrigação é ser, com perdão da
tautologia, fofo. Tentar convencer o consumidor de que aquele produto de massa
vendido para multidões sem rosto foi feito com carinho só para ele e por gente
como ele, que tem seu jeito e fala sua língua.
É claro que no fundo nunca foi outro o desafio do papo de vendedor em
todos os tempos e do discurso publicitário de um século para cá. O potencial
comprador deve ser abordado como gente –de preferência "gente como a
gente"– e não como alvo a ser abatido. É preciso criar um clima, um
vínculo emocional. Ou, como está na moda dizer hoje, uma narrativa.
Isso foi ficando mais difícil à medida que se agigantavam os mercados. No
último quarto do século 20 chegamos àquela situação absurda em que, como
apontou o escritor americano David Foster Wallace em seu famoso ensaio sobre a
ironia, "produtos alegadamente capazes de distinguir os indivíduos da
multidão são vendidos para imensas multidões de indivíduos."
O texto fofo é uma resposta desesperada a essa contradição. O que o torna
diferente dos velhos pregões de venda são os altíssimos teores de cara de pau
exigidos pelas juras de autenticidade, maneirice e paz entre os seres humanos
que compõem seu trololó hipster. Quem acreditaria nesse caô?
Uma criança, claro. Uma criança que ainda acredita no Coelhinho da Páscoa
acreditaria. Eis por que o texto fofo é sobretudo, desafiando a verossimilhança
e o senso de ridículo, profundamente infantil e infantilizante. "Relaxa,
darling!"
Quem ainda não se convenceu de que há na floresta da comunicação um novo
animal chamado texto fofo deve consultar o site do banco digital para jovens
que o Bradesco lançou há três meses, chamado Next. Lá se leem coisas assim:
"Um jeito lindão e fácil de ver como tá seu dinheiro. Sem
surpresinha." "Junta a grana da galera sem perrengue."
"Você merece todo o nosso <3". Não é fofo, gente?
[Foto: Flickr - fonte: www.folha.com.br]

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