Em uma parede branca vazia em
um escritório de advocacia de Jerusalém, uma obra de arte impressionista
pendurada guarda 80 anos de tragédia, conflito, mistério e redenção.
Meir Heller, advogado em Jerusalém, prepara quadro que será enviado para os Estados Unidos |
Escrito por ARON HELLER/AP
O quadro "Basket Weavers", de Max
Liebermann, está pronto para retornar aos herdeiros americanos de seu
proprietário original, judeu, depois que foi confiscado pelos nazistas, vendido
por um comerciante inescrupuloso e, finalmente, comprado por um sobrevivente do
Holocausto israelense que desconhecia o seu passado obscuro.
Depois de uma negociação marcada pelas
emoções, a valiosa tela agora está sendo enviada aos Estados Unidos, em um
acordo que o advogado envolvido no trato chamou de uma conclusão apropriada
para uma saga que colocou dois sobreviventes do Holocausto um contra o outro —
e expôs uma das persistentes feridas da campanha alemã para aniquilar os judeus
da Europa e roubar seus pertences.
Meir Heller, o advogado de Jerusalém cujo
cliente israelense insiste em manter seu anonimato, disse que ambos ficaram
aliviados por finalmente terem fechado este círculo histórico.
Este não era um caso legal que eu queria ganhar
porque não seria uma vitória para qualquer um dos lados ou para os interesses
do povo judeu — disse Heller. — Estou feliz por termos chegado a um acordo com
todas as emoções e todas as bagagens envolvidas.
O advogado Peter Toren, com sede em Washington,
disse que seu pai David, de 91 anos, estava ansioso para receber a pintura, mas
classificou a situação como "agridoce", uma vez que o idoso se tornou
cego e não poderá desfrutar da sua beleza.
Ele
vive de emoções mistas, porque ele ainda abriga, compreensivelmente, muito
ressentimento e raiva para com os alemães — contou Toren. — Uma pintura
certamente não pode compensar isso.
'ARTE DEGENERADA'
Etiqueta identifica a pintura de Max Liebermann |
O conto começou em 1939, quando o rico
industrial judeu e colecionador de arte David Friedmann foi forçado a fugir, e
os nazistas saquearam a vasta coleção que ele deixou para trás. Muitos dos
trabalhos terminaram nas mãos de Hildebrand Gurlitt, um notório negociante de
arte alemão que vendia o que os nazistas chamavam de arte degenerada — obras
consideradas inferiores por serem não alemãs, judias ou comunistas ou, como é o
caso dos impressionistas e de outras obras modernistas, não empregavam formas
tradicionalmente realistas — mas estavam satisfeitos em vender para ajudar a
financiar sua máquina de guerra.
A maior parte da coleção de Gurlitt permaneceu
escondida por décadas, e especialistas temiam que as peças teriam sido perdidas
ou destruídas. Mas em uma descoberta chocante, uma vasta horda ressurgiu em
2012, quando as autoridades alemãs invadiram um apartamento de Munique
pertencente a seu filho Cornelius, enquanto o investigavam por evasão fiscal.
Pinturas de artistas como Claude Monet,
Pierre-Auguste Renoir e Henri Matisse foram descobertos. Cornelius Gurlitt
disse que tinha herdado muito da arte de seu pai.
O recluso Cornelius Gurlitt manteve mais de
1.200 obras em seu apartamento em Munique e mais 250 em Salzburgo, na Áustria.
A descoberta jogou uma nova luz para os muitos casos não resolvidos de peças de
arte saqueadas de judeus que nunca foram devolvidas aos proprietários originais
ou seus descendentes.
Quando há um plano para o genocídio, então é
O.K. roubar e saquear. Existe um completo desrespeito por quaisquer direitos
individuais — disse Yehudit Shendar, uma vice-diretora aposentada do Museu do
Holocausto Yad Vashem em Jerusalém. — Toda a questão do roubo de arte está
diretamente relacionada com o fato de que seus proprietários estavam destinados
à destruição.
[Fotos: Ariel Schalit / AP - fonte: www.oglobo.globo.com]
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